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Cartas

NÃO SEI QUEM É O PAI!

NÃO SEI QUEM É O PAI!

 

 

 

----- Original Message -----
From: NÃO SEI QUEM É O PAI
To: contato@caiofabio.com
Sent: Friday, August 18, 2006 6:55 AM
Subject: Meu problema!

 

Oi, querido Caio!


Um mês atrás lhe enviei um e-mail. Você não me deu retorno. Mas tudo bem.

Minha história é muito complexa, apesar de não ficar me questionando ou me lamentando por nada que me aconteceu.

Acho que as situações acontecem em nossas vidas; e devemos tirar proveito de tudo.

Mas... é o seguinte: aos 11 anos de idade fui assediada sexualmente pelo meu cunhado (casado com minha irmã mais velha). Ele me dava revistas pornô pra eu ver e ficava nu; e também me pedia pra ele fazer sexo oral em mim. Eu, muito inocente, mal sabia o que era sexo, quanto mais oral... Porém, foi despertada a minha sexualidade. Nunca permiti que ele tocasse em mim. Namorei alguns rapazes; não fiz sexo com nenhum; apenas me masturbava, pois tinha muito "medo" de Deus e de meus pais.

Aos 23 anos conheci uma pessoa, que foi fogo fulminante...

Apaixonei-me desesperadamente por ele e ele por mim. Foi inevitável o sexo.

Ficamos dois anos namorando. Então pesou sobre ele a cobrança da mãe. Como eu era da Assembléia e usava calça e batom... e ainda tinha uma vida sexual ativa com ele, já viu, né?

Ele, pra agradar a mãe, procurou outra pessoa, que combinasse com a "cultura" ridícula dos pais (que é pastor e adúltero; e tem outra família).

Enfim, nós nos afastamos e foi muito doloroso pra mim.

Desde então não consigo fazer amor com ninguém como fazia com ele.

Um dia conheci meu [atual] esposo e nos casamos. Porém, antes de nos casarmos eu me encontrei com este “ex” e ele me contou que não conseguia também manter relação com a esposa apesar de já ter casado fazia um tempo.

Encontramos-nos secretamente algumas vezes, e foi um desastre!

Eu engravidei; e o pior: não sabia quem era o pai.  Apesar de com meu “namorado” ter tido poucas vezes.

Tive a criança, que é a minha cara misturada com a do outro. Meu esposo nunca desconfiou, mas eu senti muita angústia por causa disso. Sei que é ridículo, mas não faço sexo há quase três anos com ele; e ele não me procura também.

Vivemos um relacionamento de amizade!

Na verdade não sei nem o que pensar, pois meu coração ainda está ligado ao outro, mas preciso viver minha vida.

Qualquer palavra que você me der vai ser de grande valia pra mim, pode ter certeza; pois, nunca confiei a ninguém essas coisas. E eu confio, primeiramente, no nosso Senhor e na misericórdia Dele para comigo. Mas quero e preciso, urgente, de uma palavra sua.


Deus continue abençoando-o!



Resposta:

 


Minha querida amiga: Graça e Paz!

 

Obrigado pela confiança! Peço a Deus que minhas palavras possam ajudá-la de algum modo.

Com respeito ao seu passado (refiro-me ao seu abuso infantil), aparentemente não lhe deixou seqüelas, pois sua narrativa no resto da carta não mostra os problemas de uma pessoa seqüelada, mas apenas os de uma mulher normal. Portanto, nem busque encontrar correlações, visto que se elas existissem, já estariam óbvias nesta fase de sua vida.

Com relação à sua vida conjugal e aos problemas que decorreram dela, eis o que penso com toda simplicidade:

Primeiro você deve saber que há algo muito anormal no seu casamento. Nenhum jovem casal entra nesse estado de indiferença sexual a menos que haja algo acontecendo com pelo menos um deles no seu caso seria com o seu marido (principalmente). Assim, antes de tudo, vale buscar saber o que é. Ele pode estar cansado. Pode estar arrependido de ter se casado com você. Pode não gostar tanto de sexo quanto você. Pode também ter seu próprio conflito... (não quero especular a respeito) Enfim, só mesmo ele dizendo o que está acontecendo.

Segundo, saiba: independentemente de qual seja a causa da frieza dele, você e ele precisam resolver este assunto. Digo: não apenas porque você ainda sente o desejo de ter o outro (e tal desejo aumenta com a indiferença sexual de seu marido), mas sobretudo porque você não resistirá essa situação para sempre e, certamente, virá a se envolver com alguém ou com o próprio “ex”. Portanto, você tem que resolver a situação, pois, do contrário, as conseqüências poderão ainda ser piores.

Terceiro: não atribua a paternidade do filho ao outro. Viver com seu marido e tendo um filho cujo pai você não sabe quem é já é, em si, um grande problema. Entretanto, caso você deseje salvar seu casamento, este assunto precisa encontrar paz em seu coração, pois, caso assim não seja, o resultado será devastador, posto que as pessoas se comunicam mesmo quando não falam nada com a boca ou em palavras. Afinal, você já tem uma inclinação inconsciente quanto ao desejo de que seu “ex” fosse e ou seja o pai. Digo isto baseado no que você escreveu: “Tive a criança, que é a minha cara misturada com a do outro”. Assim, cuide-se para que você mesma não esteja já se auto-induzindo a um estado de carência por ele, o pai do filho a quem você chamou de “criança” (imaginei que você não revelou se é menino ou menina a fim de preservar a sua identidade nesta carta).   

Quarto: proponha ao seu marido uma busca consciente pelo refazimento do casamento de vocês. Sim, porque sem que seja algo da vontade e da consciência, nada se consegue nessa área.

O que também me preocupou foi a seguinte declaração: “Desde então não consigo fazer amor com ninguém como fazia com ele.” Ou seja: você está dizendo que nunca mais conseguiu quebrar aquele padrão. Assim, o que posso lhe dizer não é algo sobre o fato de ele ser “o homem de sua vida”. Afinal, muitas vezes, tais marcas não são feitas pelo amor, mas sim pelo mito psicológico que a gente cria e projeta no outro. Portanto, o que tenho a lhe dizer é que pode ser que se você tivesse a chance de viver com o “ex”, logo viesse a constatar o fato de que ele não é “aquilo tudo”, conforme hoje sua memória mais que seletiva diz a você. Isso sem falar que a tragédia que você viveu com ele tem o poder de transformá-lo no que ele de fato não é. Mas isso é algo que você só reconheceria se tivesse vivido com ele; ou se hoje desse a você mesma a chance de um reencontro com ele (não para transar, mas para viver junto com ele). Todavia, pela descrição que você fez dele na carta (na hora em que o “bicho pegou”, pulou fora!), a própria idéia de que ele possa ainda ter poder sobre você é, em si mesma, a declaração acerca da seletividade de sua memória —construindo um cara que não existe!—, bem como é a declaração de sua propensão à evasão da realidade, amando um holograma de homem, e que não tem nada a ver com ele (com o próprio).   

Também me preocupou o fato de você ter uma criança que você pensa (ou deseja) ter no seu “ex” o pai. Sim, porque isso cria pra você um ambiente psicológico no qual a sua maternidade alimenta o mito; posto que você acaba sem foco no coração, e, literalmente, mistura a cara dele (de sua criança) com a do suposto pai e com a sua carinha. Assim, você se casou, silenciosa e psicologicamente, com o seu “ex”, pois, a cada dia, a cada sorriso, você vê o outro na face de sua criança.
  
Portanto, saiba estas coisas:

1. Você precisa decidir o que quer e com quem quer, pois, do contrário, você estará presa a essa idealização para sempre. E quem pode lutar e competir contra uma idealização? Todo e qualquer homem ao seu lado será infeliz enquanto você tiver no seu “ex” essa idealização, que é uma idolatria erótico-psicológica. E aqui entra a questão do abuso infantil, pois tal abuso pode ter criado em você o desejo e/ou a pulsão quanto a ter um homem irreal em sua vida. Afinal, sexo na infância é absolutamente lúdico, e, portanto, desligado da realidade objetiva.

2. Esse homem —seu “ex”— não existe! Ele é apenas uma construção sua. Na realidade nem a esposa dele o reconheceria se ouvisse você falar nele. 


O mais é o que já lhe disse antes!


Receba meu carinho!


Nele, que constrói sobre a Rocha da Verdade,

 

Caio

 

 

 

 

 

 
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