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Opinião

ENTREVISTA: A SUBVERSÃO DO CRISTIANISMO

ENTREVISTA: A SUBVERSÃO DO CRISTIANISMO



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From: ENTREVISTA: A SUBVERSÃO DO CRISTIANISMO
To: contato@caiofabio.com
Sent: Friday, April 29, 2005 2:26 PM
Subject: ACERCA DE UMA POSSÍVEL NOVA REFORMA


Reverendo Caio,


A pergunta que finalmente encaminho é um tanto genérica. Mas baseada em um pequeno trecho do excelente "Cartas do Coisa-Ruim", do CS Lewis:


"Meu caro pé-de-cabra,


O que nos perturba, no tocante à turma com quem anda seu paciente, é que ela é simplesmente cristã... O que nós desejamos, se fazem mesmo questão de ser cristãos, é mantê-los num estado de espírito ao qual chamo 'cristianismo e'. Você me entende: Cristianismo e a Crise, Cristianismo e a Nova Psicologia, Cristianismo e a Nova Ordem, Cristianismo e a Cura pelo Espírito, Cristianismo e a Pesquisa Psíquica, Cristianismo e Vegetarianismo, Cristianismo e Reforma Ortográfica. Se querem absolutamente ser cristãos, que o sejam com uma diferença. Substitua pela Fé qualquer moda colorida de cristianismo..."


A pergunta: em sua opinião, quais os "complementos" que prejudicam o avanço autêntico da fé bíblica no Brasil atualmente?


Resposta:


Sou de origem Presbiteriana e Católica. Meu pai era Católico e minha mãe Protestante Reformada. Portanto, sou filho das culturas religiosas e cristãs que mais fortemente moldaram o Ocidente: o catolicismo e o protestantismo. Daí, tudo o que eu falar a respeito, será com muita dor, posto que mesmo agora, enquanto escrevo, choro, vendo aquilo no que a fé em Jesus se tornou entre os cristãos em geral.


É obvio que a Cristandade é maior do que esses dois veios entre os quais eu cresci. Porém, não há dúvida quanto ao fato de que eles são os mais importantes na Cristandade, historicamente falando.


De fato, de certa forma, o que aconteceu ao Cristianismo no Brasil é demonstrativo do que aconteceu ao Cristianismo no mundo todo. Portanto, ao falar de qualquer coisa relacionada ao Cristianismo brasileiro, sei que estou falando também de algo que é tão variado como fenômeno, que pode ser visto como boa síntese do que aconteceu ao Cristianismo no mundo. Quem acompanha o que está acontecendo ao Cristianismo no mundo, incluindo todos os regionalismos, sabe que no Brasil cada uma dessas peculiaridades religiosas e culturais, indo dos Católicos aos Reformados—com todas as variáveis desses movimentos—, dos Pentecostais aos Neopentecostais—com todos os matizes possíveis, indo da tradicionalíssima Assembléia de Deus, à Universal e seus filhotes de franquia—, são manifestações locais e gigantescas do que acontece no mundo, na maioria das vezes sem a diversidade com qual o fenômeno cristão se manifesta no Brasil.


Digo isto apenas para chegar ao significado da Cristandade no mundo de hoje e no Brasil. Na minha opinião o “Coisa-ruim” não tem muito com o que se preocupar no Brasil. “Pé-de-cabra”, por aqui, conseguiu levar a maioria a praticar o “Cristianismo e...”; o que é ainda pior do que “Meramente Cristianismo”; ou ainda pior do “Cristianismo e Nada Mais”.


Ora, o que estou dizendo é que a questão é mais profunda do que “Cristianismo e”. De fato, o problema é o “Cristianismo”.


O que os cristãos precisam saber é que Jesus não era cristão, e que nem tampouco quis Ele fundar o Cristianismo, nem ainda teve Ele interesse em algo que se assemelhasse à civilização cristã ou mesmo com a “Igreja”, conforme nós a conhecemos de 332 de nossa era até hoje.


Na realidade, quem entendeu o Evangelho e seu significado, sabe que o Cristianismo já é uma grande vitória do “Coisa-ruim”, posto que ele (o Cristianismo) já é uma perversão, transformando o Evangelho puro e simples numa religião, com Dogmas, doutrinas, usos, costumes, tradições com poder de imutabilidade, moral própria, e muita barganha com os homens, em franca e pagã manipulação do nome de Deus, praticando, assim, uma obra de estelionato contra o Evangelho de Cristo.


Jesus criou o caminho da fé na graça e no amor de Deus, o que deveria ser algo livre como o vento, e vivo e móvel como a água.


Quem pode ouvir o ensino de Jesus, com toda sua desinstalação, com toda a sua mobilidade, com toda a sua liberdade de aplicação sem legalismo ou fixidez, com toda a confiança do Semeador no poder da semente-palavra, com toda ênfase na igualdade de todos, com toda a vindicação de individualidade para cada um, com toda denuncia aos poderes religiosos, e com toda a pertinência à vida—fosse para curar a mente, o corpo ou o espírito; fosse para anunciar a destruição do Templo como lugar de Deus; fosse para beatificar samaritanos e demonizar religiosos sem coração—; e, ainda assim, imaginar que Jesus tem qualquer coisa a ver com o que nós chamamos de “igreja”, seja aquela que se abriga no Vaticano, ou sejam aquelas que têm tantas sedes quantos pastores, bispos e apóstolos megalomaníacos existirem?


O mundo praticamente só conheceu o Cristianismo, posto que a própria Reforma ainda foi um desses “e” acerca do qual o “Coisa-ruim” falou com o “Pé-de-cabra”.


O mundo não teve ainda a chance de conhecer o Evangelho, conforme Jesus, e conforme as dinâmicas livres e libertadoras do caminho, conforme as narrativas dos evangelhos, nas quais o único convite que existe é para se “seguir” a Jesus.


Uma Reforma é ainda “remendo de pano novo em veste velha”.


Buscar reformar o Cristianismo é uma nobre idealização do “Coira-ruim”, pois, assim sendo, nada muda, mas apenas se adia o comprometimento radical que o Evangelho demanda.


O Cristianismo é uma tentativa vitoriosa do “Coisa-ruim” quanto a tentar diminuir a loucura da pregação e o escândalo da Cruz.


O Cristianismo é a cooptação feita culturalmente pelos gregos e politicamente pelos romanos, daquilo que um dia havia sido apenas o Caminho, conforme o livro de Atos dos Apóstolos.


No Cristianismo Deus tem Seus representantes fixos e certos na terra—o clero, seja ele Católico ou Protestante—, tem Suas doutrinas e Dogmas escritos por concílios de homens patrocinados por reis, e tem na sabedoria deste mundo seu instrumento de elaboração de Deus: a teologia.


No Cristianismo Deus é objeto de estudo e de sistematização teológica; e, de fato está a serviço de ideologias variadas.

Desse modo, no Cristianismo, “Deus” não passa de uma Potestade religiosa e de um poder mantido pelos homens, posto que se crê que sem o Cristianismo e a Igreja, Deus está perdido no mundo.

Ora, que reforma há a ser feita naquilo que não deveria jamais ter existido?


De fato, a coragem que se demanda desta geração é bem maior do que aquela que fez com que camponeses oprimidos pelo papado de Roma tiveram que ter a fim de iniciar a Reforma. Digo isto porque ‘ali’ a mudança não era radical.


A Reforma arrancou os ídolos do lugar do culto, e os retirou da devoção dos fiéis; aboliu o papado, acabou com boa parte do clero conforme a formatação católica, e afirmou que a Graça, Cristo, a Escritura e a Fé eram os ‘pilares’ sobre os quais a “igreja” deveria ter seus fundamentos.


No entanto, a Reforma não se viu livre das técnicas gregas de ‘fazer teologia’ e suas sistematizações, e nem abriu mão do logicismo grego, antes utilizando-se dele a fim de criar seus próprios credos, dogmas, doutrinas e leis morais.


A Reforma é um Catolicismo que fez Dieta. Só isso.


Todavia, a coragem revolucionária que o Evangelho demanda de cada geração a fim de viver o continuo processo de conversão e de não conformação com este mundo, é aquela que se lança ao vento, e caminha pela fé, e que se dispõe a se deixar reinventar conforme o espírito do Evangelho, posto que o Evangelho não propõe uma religião, mas o Caminho.


Ora, isso significa que cada nova geração tem que ter a coragem de vestir o Pano Novo do Evangelho no seu tempo e beber o Vinho Novo do Reino em odres novos conforme a atualização que o espírito do Evangelho faz de si mesmo em cada nova era na existência dos humanos.


O Cristianismo não acabará. Ninguém tem o poder humano para acabar uma confraria moral e religiosa movida por tantos e tão variados interesses humanos e mundanos como o é o que acontece com a religião cristã.


Eu, de mim mesmo, e apenas tomando a liberdade de pensar e crer que o Evangelho me concede, acredito que se há de haver um “anti-cristo” humano na terra, sem dúvida, ela será “cristão”. Afinal, eles “procedem do meio de nós”; e, historicamente, nada significou um estelionato mais sutil e maligno do que a perversão do Evangelho no Cristianismo.


O Brasil está cheio de Cristianismo, e, paradoxalmente, morto do Evangelho.


“Coisa-ruim” e “Pé-de-cabra” estão de férias, aproveitando que o trabalho deles já tem muitos e muitos voluntários em pleno engajamento, e trabalhando com toda avidez, dizendo que o que realizam é em nome de Deus, sem saberem que fazem a vontade do “Coisa-ruim”.


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O sr. poderia propor uma "agenda mínima" de uma, digamos, Nova Reforma?


Resposta:


Conforme eu disse, não creio em Reformas. Creio, sim, numa Revolução do Evangelho, a qual, só incluirá os cristãos se eles tiverem a coragem de desistir do Cristianismo e abraçar o supremo, porém, seguro risco de apenas andar conforme a revelação da Graça de Deus em Cristo, conforme a Palavra do Evangelho.


A Revolução do Evangelho não se atém a nenhuma preocupação com construção de nada. De fato, o grande problema sempre teve a ver com a necessidade de segurança que as pessoas dizem precisar—o que a religião ficticiamente oferece—; e que é o que as impede de apenas andarem pela fé no que Jesus já fez e consumou por todos os homens.


Assim, o que se demanda é coragem para desconstrução, visto que a promessa é que o próprio Espírito sempre haverá de nos conduzir a toda a verdade. Isso quando se anda apenas pela fé.


A Reforma elegeu elegeu 95 teses e 4 pilares fundamentais; a saber: Cristo, a Escritura, a Graça e a Fé. No entanto, isso ainda é vício grego e prevalência das sistematizações doutrinárias contra o espírito do Evangelho.


Estou convencido de que a única mensagem que existe em Jesus é acerca da Graça eterna de Deus. Minha convicção pessoal também é que onde quer que o Evangelho se transforme numa fé doutrinária, ali ele morre...


Se queremos algo de verdade e sério, temos que saber que isso demandará de nós uma volta humilde e sem tradições para a Palavra, isso a fim de sermos completamente lavados das tinturas com as quais o Cristianismo pintou a fé para nós.


Quando se diz que Cristo, a Escritura, a Graça e a Fé são o nosso fundamento, isso soa belo, mas ainda é perversão. Na realidade o fundamento é Cristo, e os Apóstolos e Profetas são fundamento apenas na medida em que dão testemunho do espírito de Jesus e da Graça.


Criar uma doutrina da salvação e que tenha a ver com aquilo que o homem possa fazer em obediência a uma doutrina escrita e sistematizada por homens, é blasfêmia.


Cristo é tudo!


É a partir de Jesus que a Escritura toda tem que ser lida. E tudo aquilo que nela (na Escritura) não der testemunho do Evangelho—segundo os evangelhos, Paulo e o escritor de Hebreus—, é algo a ser considerado como tendo se tornado obsoleto.


Assim, não basta que se tenha Escritura nas mãos e sendo objeto de estudo. Isso porque a Escritura, quando lida pelas mediações doutrinarias de nossos doutores e mestres, não promove o Evangelho, mas tão somente a Lei Moral e os Dogmas inventados pelo Cristianismo.


Quando, porém, a Escritura é lida a partir dos ensinos, dos feitos e dos modos de Jesus, então ela pode ser útil. Quando, porém, ela é algo que ‘contém também Jesus’, estabelece-se a tragédia. Digo isto porque desde a Encarnação a Escritura perdeu seu poder de dizer “como”, posto que é em Jesus que a Escritura se explica em sua síntese e suma. Jesus é a Chave Hermenêutica de tudo, incluindo a Escritura.


As implicações do que estou dizendo, todavia, promovem desconstruções profunda demais; e, eu, pessoalmente, não acredito que esses que se acostumaram ao vinho velho, jamais dirão que o novo é melhor.


Sei que o que digo é verdade segundo o Evangelho, mas também sei que tal fé é incompreensível pelas mentes viciadas no Cristianismo; e sei que é desinstaladora demais para aqueles que vivem do negócio clerical cristão.


Quanto a uma possível agenda para uma “Nova Reforma”, sinceramente, se eu sucumbisse à tentação de oferece-la, já estaria sucumbindo à tentativa grega de sistematizar o não-sistematizável.


O que creio é que há um Basta de Deus em processo de eco no ar...


O reino é Dele. A Igreja é Dele. O Povo é Dele. E Ele mesmo haverá de nos surpreender.


Quem, porém, desejar o Novo, então, se desejar ajudar, que não faça mais nenhuma barganha com a religião cristã, e, em contrapartida, que se entregue de coração ao Evangelho de Jesus, e que viva conforme a simplicidade da fé que confia que ‘tudo está feito’, e que não sobrou tarefa complementar e vicária a ser realizada por mais ninguém, nem pela igreja.


Desse modo, sei que sou uma voz solitária no deserto. Aliás, no que diz respeito a dizer o que digo, outros também o dizem, a diferença é que dizem e não fazem.


Na hora em que milhares e milhões que assim crerem passarem a viver livres conforme o Evangelho, então, sem pai, sem mãe e sem fundador, a revolução se estabelecerá, sem sede, sem geografia, sem dono, sem tutor, e sem reguladores da fé.


Isso, todavia, só será real e genuíno se Jesus for tudo, e o espírito do Evangelho da Graça for a única lei da vida.


Bem, vou ficando por aqui. Quem quiser saber se o que digo é verdade, então pratique, e logo verá que o que digo não é uma teoria da revolução, mas sim o próprio espírito do Evangelho. Além disso, creio que meu site é um bom guia do que creio e ensino a esse respeito.



Caio
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